O “Livro V” do livro Ética a Nicômaco, aborda a teoria da justiça, ampliando-a e limitando os conceitos de justo e injusto. Adota-se como princípio as seguintes definições; justiça é a disposição da alma graças à qual elas se dispõem a fazer o que é justo. E injustiça é a disposição da alma graças à qual elas agem injustamente e desejam o que é injusto.
Os termos “justiça” e “injustiça” são ambíguos, desse modo, é possível determinar alguns sentidos. O termo “injusto” é empregado tanto para pessoas que infringem a lei quanto para pessoas ambiciosas e iníquas. Assim sendo, o justo é aquilo que é conforme à lei e correto, e o injusto é o ilegal e iníquo.
No que diz respeito a justiça e a injustiça devemos indagar com que espécie de ações se relacionam elas, que espécie de meio-termo é a justiça. Justiça é a virtude completa, por isso, a justiça é muitas vezes considerada a maior das virtudes. Justiça é a virtude completa no mais próprio e pleno sentido do termo, porque é o exercício atual da virtude completa.
A existência da injustiça no sentido restrito é indicada pelo fato de que, enquanto as pessoas que mostram em ação as outras formas de deficiência moral agem realmente de maneira errada, mas sem ser ambiciosas. As pessoas ambiciosas não mostram, na maioria das vezes, deficiência moral mas mostram alguma espécie de maldade e injustiça. Há outra espécie de injustiça que é uma parte da injustiça em geral, e uma acepção da palavra “injusto” que corresponde a uma parte do que é injusto no sentido geral de “ilegal”.
O justo é o proporcional, e o injusto é o que viola a proporção. O igual é o meio-termo entre a linha maior e alinha menor, de acordo com uma proporção aritmética, e essa é a origem do termo justo, onde o juiz é que media a situação. O justo é intermediário entre uma espécie de ganho e uma espécie de perda nas transações que não são voluntárias, e consiste em ter uma quantidade igual antes e depois da transação.
A reciprocidade deve fazer-se de acordo com uma proporção e não na base de uma retribuição exatamente igual, e é pela retribuição proporcional que a cidade se mantém unida. A justiça é uma espécie de meio-termo, mas não no mesmo sentido que as outras virtudes, e sim porque ela se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediária, ao passo que a injustiça se relaciona com os extremos.
Além da injustiça em sentido amplo, há outra espécie de injustiça em sentido estrito. Ambas as injustiças se manifestam na convivência entre as pessoas, mas uma se relaciona com a honra, ou com o dinheiro, ou com a segurança e sua motivação é o prazer decorrente do ganho, enquanto a outra se relaciona com tudo que está na esfera de ação do homem bom.
A espécie restante de justiça é a corretiva, que tanto se manifesta nas relações voluntárias quanto involuntárias. O justo, portanto, é em certo sentido um meio termo entre o ganho e a perda nas ações que se incluem entre as voluntárias, e consiste em ter uma parte de igual antes ou depois da ação. Existe um meio termo entre as iniquidades (homem injusto e ato injusto), esse meio termo é o “igual”. Se então, o injusto é iníquo (desigual), o justo é igual.
A justiça é a observância do meio termo, mas não de maneira idêntica à observância de outras formas de excelência moral, e sim porque ela se relaciona com o meio termo, enquanto a injustiça se relaciona com os extremos. E a justiça é a qualidade que nos permite dizer que uma pessoa está predisposta a fazer, por sua própria escolha, aquilo que é justo. Porém, por outro lado, a justiça está relacionada com o injusto, que é o excesso e a falta. No ato injusto, ter muito pouco é ser tratado injustamente, e ter demais é agir injustamente.
Existe uma justiça natural e uma justiça que não é natural e ambas são imutáveis. É possível ver quais são as coisas entre as que podem ser de outra maneira que são como são por natureza, e quais as que não são naturais, e sim legais e convencionais. É possível determinar se um ato é ou não um ato de justiça ou injustiça, a partir da sua voluntariedade ou involuntariedade; quando ele é voluntário, o agente é censurado, e somente nesse caso trata de um ato de injustiça, de tal forma que haverá atos que são injustos, mas não chegam a ser atos de injustiça se a voluntariedade também não estiver presente.
Ela é completa porque a pessoa que a possui pode exercer sua virtude não só em relação a si mesmo, como também em relação ao próximo. O magistrado é um guardião da justiça e, portanto, também guardião da igualdade. Uma classe de atos justos se compõe de atos que estão em consonância com alguma virtude e que são prescritos pela lei.
Também há primazia na construção de uma ética científica; ela é classificada como uma ciência prática, como uma parte que antecede a política. Depois das ciências teoréticas, vêm as ciências práticas, que dizem respeito à conduta dos homens e o fim que eles querem atingir, seja como indivíduos ou como parte de uma sociedade política. O estudo da conduta e do fim do homem como indivíduo cabe à ciência ética.
O texto expõe a diversas maneiras de conceituar e aplicar o termo justiça e injustiça, sendo assim, cada conceito varia de acordo com quem pratica ou sofre a injustiça, quais situações são injustas e justas, e o que faz tal injustiça ser feita. É possível concluir que a justiça é uma virtude, que faz parte da ética/hábito que faz parte do jeito de agir em face da sociedade. Sendo assim, a ética não é um saber teórico nem matemático, mas um saber funcional, podendo ser aprendido.
A exposição começa mostrando conceitos e analogias no ramo do Direito na antiguidade. Em seguida, são explicados, mais detidamente, os enfoques teóricos admissíveis, bem como os conceitos abordados ao longo do texto. Fazendo uso de um linguajar mais rebuscado para que a sua obra esteja em consonância com o meio pelo qual foi veiculada, o autor mostra-se capaz de transmitir as informações de forma enfática e objetiva, porém não compromete o entendimento do texto usando um vocabulário erudito.
Esse tema adquire um papel de destaque social pela necessidade de estudar o problema da moral nas relações humanas, pela necessidade de voltar ao início da ética e indicar os principais conceitos propostos por Aristóteles, ressaltando a relevância desta proposta ética.
Referência da obra: ARISTÓTELES. Ética a Nicômacos. 3ª edição. Tradução do grego, introdução e notas Mário da Gama Kury. Brasília: Editora UnB, ©1985, 1992. Livro V, p. 91-111